domingo, setembro 25, 2005

Uma Coisa

Eu já estou cansado de descobrir as coisas e meus vinte e dois anos representam a própria eternidade diante da vida. A fossa existencial é uma constante, e não há alternativa de fuga, pois os momentos são momentos e a felicidade - já está claro - não existe em tempo eterno!! Há um tempo para o peixe e um tempo para o pássaro, já disse o poeta baseado em dizeres de filósofos antigos, mas a verdade é a verdade e está colada à minha retina exausta. Há um momento feliz e um infeliz. A partir do instante em que a fase feliz entra em minha vida, eu já vivo à espera do próximo instante desagradável e fico imaginando como virá, oriundo de quê? Da vida sim, mas sob que forma? Enfim, uma série de imagens antes do fato em si. Aí permaneço no momento feliz tendo o conhecimento profundo de que este momento feliz não deve ser vivido com a felicidade que dele exala. Não há como um cérebro , que jamais deixa de examinar todos os instantes que advirão, se deixar levar por um ínfimo instante de felicidade, quando os problemas não foram solucionados em suas bases. Aí eu penso: como viver o momento presente se o futuro não me deixa seguir sossegado? Bem que eu gostaria de não saber de nada, de não entender as coisas tão profundamente ao ponto de fazer uma energia nociva ao meu mundo já agitado por si só! Mas, na verdade, eu gosto de saber das coisas por antecipação, mas este saber antecipado me cansa, me deixa prostrado diante das portas fechadas que eu já sabia que não iriam se abrir pra mim!! Minha existência caminha muitos anos à frente do meu corpo, e é justamente meu corpo frágil, magro, esquálido e desprovido de reservas de energia que tem que suportar as demandas da mente atribulada, terrivelmente neurotizada pela civilização.

sexta-feira, setembro 16, 2005

Segue o teu destino

Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode Dizer-te.
A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.
Ricardo Reis

sábado, setembro 10, 2005

A Mágica da Poesia


Um certo estado de alma, um sentimento particular, pode apossar-se de um poeta e impor-lhe, por assim dizer, a expressão e a representação, numa forma minuciosa ou resumida, de sentimentos que se referem a circunstâncias e eventos exteriores: festas, vitórias, etc. O exemplo mais típico deste gênero é dado pelas Odes de Píndaro que são, no sentido mais autêntico da palavra, poesias de circunstância. Goethe, por sua vez, utilizou muitas situações deste gênero e até se pode, alargando o quadro, considerar Werther como um poema de circunstância.
Ao escrever Os Sofrimentos do Jovem Werther, Goethe produziu uma obra de arte a que deu, como conteúdo, as suas próprias aflições e seus tormentos, os seus próprios estados de alma, procedendo como todo poeta lírico que, ao procurar aliviar o coração, exprime aquilo de que é afetado enquanto sujeito. Graças a isso, o que era interior imobilidade acha-se livre e transforma-se num objeto exterior de que a pessoa se libertou. Do mesmo modo as lágrimas servem de derivativo à dor do que, por assim dizer, se esvai através delas. Como ele mesmo o disse, Goethe escreveu o Werther para se libertar da angústia íntima, e conseguiu-o.
Em tais situações líricas, pode refletir-se, por um lado, um estado objetivo, uma atividade referenciada ao mundo exterior, e, por outro lado, um estado da alma que, desligando-se de tudo o que é exterior, regressa a si mesma e torna-se o ponto de partida de estados internos e de sentimentos profundos